Vigília x Sonhos: o que diferencia os sonhos de estar acordado?

Vigília x Sonhos

Tenho acompanhado os artigos recentes de pesquisadores como Stephen LaBerge, Allan Hobson e Ursula Voss. É uma tríade de peso, cada qual com seu respectivo Ph.D e com pesquisas fascinantes na área dos sonhos lúcidos. O último texto acerca da relação entre estados psicóticos e sonhos lúcidos reflete bem isso. Nesse texto estou explorando as críticas de LaBerge(1) ao estudo de Allan Hobson sobre sonhos lúcidos ou a consciência nos sonhos.

Vigília x Sonhos
Comparativo de uma análise topografica de atividade cerebral entre os estados mentais quando acordados(o superior), no estado do sonho lúcido(meio) e em fase REM comum(não lúcido). Allan Hobson e alguns pesquisadores classificam o sonho lúcido como um Estado Dissociado(ED).

A entrada recente de Allan Hobson nas pesquisas sobre sonhos lúcidos parece trazer uma abordagem nova no estudo. Seu entendimento sobre o sonho lúcido é como um “Estado Dissociado” do cérebro-mente. Verifica-se nessa compreensão um estado híbrido entre o estado desperto e os sonhos. Significa para esse pesquisador que ao sonharmos lucidamente, não estaríamos mais na fase REM do sono e sim num meio-termo de intrusão ou confusão entre a vigília e os sonhos.

Estado Dissociado (ED): pela literatura científica(²) é a reunião dos três estados da consciência. Allan Hobson defende que os Sonhos Lúcidos devem ser classificados na concepção de um estado híbrido entre a vigília e os sonhos(ED2).

Allan Hobson aponta os sonhos lúcidos como um “promissor embora problemático paradigma”. Para LaBerge não há nada de problemático. Vale para este autor a mesma linha de estudo aplicada na época da descoberta das fases REM do sono. Quando então se descobriu um período de intensa atividade cerebral, equivalente ao período da vigília(período desperto), atonia muscular, variação no sistema nervoso autônomo etc..  tudo isso(fases REM) ocorrendo naturalmente, várias vezes durante uma boa noite de sono.

Para LaBerge a compreensão de Allan Hobson sobre sonhos lúcidos está errada, pois não há que se falar num estado híbrido entre estar acordado(vigília) e sonhando, mas estar consciente durante a fase REM.

Para Stephen LaBerge os diversos estudos mostrando os sinais-verificados de sonhos lúcidos(SVLD – signal-verified lucid dreaming) durante a fase REM(ver LaBerge, 1990), são mais que suficientes para demonstrar que a fase REM é capaz de suportar a consciência reflexiva. Prossegue argumentando que foram tomadas todas rigorosas medidas nas pesquisas e que foram gravados mais de 100 experiências de sonhos lúcidos ocorrendo sempre na fase REM do sono.

Porém, ao que parece, nas palavras de LaBerge “Hobson interpreta esses resultados de maneira diferente. Porque ele acredita que a consciência reflexiva é incompatível com a fase REM do sonho, ele conclui que o sonho lúcido DEVE(grifo do autor) ser um estado dissociado, híbrido misturando os sonhos e o estado desperto(vigília)“. LaBerge segue afirmando que entende que alguém pode ser induzido ao erro pensando dessa maneira, mas contra-argumenta com a analogia de que “se a maioria dos mamíferos não voam, morcegos, se eles existem, devem ser híbridos de pássaros ratos. Isso não é bem o que é um morgeco”.

Para LaBerge a defesa de Hobson dos sonhos lúcidos como um estado dissociado ou híbrido, equivale a dizer que morcegos não são mamíferos voadores, mas uma espécie híbrida entre pássaros e ratos.

LaBerge prossegue criticando o estudo que Allan Hobson usa para fundamentar suas afirmações em que considera o sonho lúcido como um estado dissociado ou híbrido. Trata-se de um estudo de Ursula Voss e Tuin(?) de 2009, no qual, afirma LaBerge já inicia o primeiro parágrafo dizendo “Sonho lúcido é um estado dissociado…”

O estudo no qual se baseia Hobson parte da suposição que uma vez detectada a consciência reflexiva, verifica-se o estado desperto ou a vigília, por conseguinte, a presença de sinais de sonhos lúcidos na fase REM indica a presença de consciência desperta. Ignora-se dessa maneira a conclusão de que a fase REM do sono é capaz de manter a consciência reflexiva.

 

Nessa visão do sonho lúcido como um Estado Dissociado, a presença da consciência é o que determinaria a intrusão do estado desperto no sono. LaBerge contesta afirmando que só haveria essa intrusão da vigília no sono, caso nossas percepções ou sentidos(visão, audição, tato, olfato, paladar) não estivessem mais isolados.

O texto de LaBerge vai além, concentrando análise sobre o estudo  supra-citado, mas vou abordar essa parte num próximo post. Para finalizar, vale destacar o argumento central da crítica de LaBerge contra Hobson:

The essencial difference between dreaming and waking is sensory input, not reflective conciousness(Kahan & LaBerge, 1996; Llinas & Pare 1991).”


Que fica:
“A diferença fundamental entre sonho e vigília são as percepções sensoriais(exteriores), não a consciência reflexiva”.

Afinal o que realmente diferencia o estado desperto de um sonho? É a presença/ausência de consciência ou é a presença/ausência de percepções sensoriais?
Todos onironautas conhecem a sensação de estar num sonho. Mesmo naqueles sem lucidez o elemento sempre presente é o isolamento sensorial. Não há percepção do que está acontecendo em volta. Não há visão, tato, olfato, paladar ou audição. No máximo incorporamos algumas coisas de modo bem engraçado nos sonhos, mas sem distinguir este dos demais elementos que compõe o sonho.
Por fim, a consciência por si só não parece ser suficiente para demonstrar que alguém está acordado. Esse alguém pode estar consciente, mas preso dentro de um sonho…

Pelo menos para mim, fica claro que ao ficarmos lúcidos num sonho, não estamos trazendo nada que desconfigure o estado mental do sonho comum. Sua estrutura é a mesma, exceto que passamos a vivenciar as experiências de modo consciente, mas longe de estar acordado, num estado híbrido entre acordado e os sonhos ou em algum meio-termo.

Referência Bibliografica:

(1) – Signal-verified lucid dreaming proves that REM sleep can support reflective consciousness Intenational Journal of Dream Research, volume 3, nº 1. pg 26-27 (2010).

(2) – NEUROCIÊNCIA da Mente e do Comportamento. LENT, Roberto(Coordenador).
Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008.

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20 respostas

  1. Eu fico com a ideia de LaBerge, porque em uma noite com uma grande diversidade de fases REM nós não lembramos de todas, contudo não podemos afirma se ficamos consciente em uma delas, e se acordamos em um horário distante da fase REM não iremos lembrar do sonho, e como poderíamos esquecer dele em um estado de "pré" vigília '-' . Enfim fiz este comentário com os meus conhecimentos sobre o assunto que não são muitos, caso tenha alguma ideia errada ou sem sentido peço desculpas aos mais experientes no assunto (:
    Até mais Márlon ^^

  2. A idéia é essa mesmo Luiz!
    .
    Tentarmos compreender e divulgar os últimos artigos e pesquisas na área e trocarmos opiniões. Eu posso facilmente ter traduzido ou escrito alguma tremenda bobagem!
    O importante é fazer essa troca de experiências e conhecimentos, aprimorando o que a gente conhece sobre o tema.
    .
    Para mais artigos, basta colocar Ursula Voss e Allan Hobson que vai pipocar os textos relacionados com o post.

  3. Muito interessante mesmo, mas gostei mais desta parte do texto, que acho que resume bem o ato de sonhar, seja lucidamente ou não.

    "o elemento sempre presente é o isolamento sensorial. Não há percepção do que está acontecendo em volta."

    A mais pura verdade pois se notarmos bem, pelo menos comigo, tanto em sonhos normais como nos lúcidos, nunca se tem a mesma noção de espaço e tudo o que está em nossa volta, mas parece sim que focamos as imagens, sons e outros sentidos, isso incomoda muito pois dá a impressão de que ficamos quase como os burrinhos que usam aqueles "tapa-olhos" nem sei se este é o nome mesmo daquilo, rsrsrsr só sei que só deixam o animal olhar para frente e nada mais.

  4. haa eu encontrei o livro "sonhos Lúcidos" do LaBerge para download sem fins comerciais, devido ao esgotamento do livro a 10 anos aqui no brasil (de acordo com a Edição do EBOOK), não sei se posso comentar o Link aqui '-' .

  5. Tive que ler 3x para entender bem o conflito dos dois pequisadores. Acho que é difícil para um sonhador lúcido comprar a idéia de um estado híbrido.
    Difícil entender como Allan Hobson chegou nisso.

  6. Eita! Mas é isso mesmo Juliana. Tive uma trabalheira na tradução, interpretação e comparação de textos. Uma parte ou outra vai ficar confusa mesmo, mas qualquer dúvida, vamos trocar idéias por aqui!
    .
    AVISO: vou me ausentar do blog por cerca de uma semana até 10 dias(acho q nessa viagem não vou acessar internet), então peço ajuda dos colaboradores oficiais e demais onironautas para dar uma força pro pessoal que tá chegando. Abraço a todos, bons sonhos e até a volta!!

  7. Parabéns marlon, otimo trabalho. A ideia é essa mesmo juliana, os conflitos sobre a maneira como cada um ve os conceitos sobre sonhos, serve na verdade para evoluir ainda mais a nossa percepção sobre o assunto. Eu mesmo cheguei a quase sair na porrada com um amigo meu qndo entramos nesse assunto auhsahus discordamos em vários pontos e talz mais no fim das contas toda a conversa só ajudou ele a ter seus primeiros SL's e aprender a ter uma linha narrativa.

  8. Luiz, isso não justifica realmente. Por exemplo, hipnose é um estado entra dormindo e vigília, ele é pode ser acompanhado de REM e as sessões muitas vezes tendem a não serem lembradas, embora uma simples sugestão seja geralmente suficiente para reverter essa situação.
    e posta o link sim 😀
    .
    Eu discordo do Allan Hobson e fico a favor do LaBerge por um motivo muito simples: não é cabível misturar NREM com REM, são dois estados necessariamente opostos, fora que os experimentos do LaBerge "100 experiências de sonhos lúcidos ocorrendo sempre na fase REM do sono" e a parte do LaBerge sobre o isolamente sensorial é confusa. Apenas estamos paralisados, mas sensações físicas provocadas no corpo costumam ser incorporadas nos sonhos, como uma justificativa do subconsciente para as sensações. Entretanto, como subconsciente incorpora, isso sugere que ele continuamos isolados, pois ele não reage aos estímulos como reage na vigília, muito menos o consciente.
    Entretanto, isso também sugere confusão mental.

    É realmente muito confuso mas acho que as pesquisas do Allan Hobson são muito inconsistentes pelo o que eu li.

  9. Queria perguntar algo mas não achei um post que coubesse este assunto, então resolvi perguntar aqui: Eu tenho sonhos lúcidos desde nova, e em um certo tempo apresentei uma continuidade de sonhos que durou dois anos, sonhava com a mesma pessoa a qual não conheço. Mas a pergunta é sobre a relação entre eu sonhar lucidamente sem nenhuma dificuldade e o fato de eu ter tido disritimia cerebral quando criança e ainda apresentar hiperatividade na região rolândica do cérebro? Obrigada!

  10. Olá paloma, bem vinda ao blog, sempre que precisar perguntar estaremos aqui. Como ja citamos uma vez em outros comentarios aqui, a ciencia onirica começou a ser desbravada pelos cientistas dos anos 70 pra cá então os principios que podemos afirmar são poucos. Seu caso é raro, até hoje nao vi nenhum relato que complicações neurológicas favoreçam a lucidez no sonho até pq como podemos observar em alguns posts aki a lucidez depende muito da atividade de neurotransmissores enquanto dormimos, sua lucidez pode se dá pelo fato de seu cérebro dormir com neurotransmissores ligados à mais ou algo do genero no caso vc teria que passar em um medico especialista. Lembrando que a lucidez oscila, vc precisa analisar como se da sua lucidez se vc só cita estar sonhando ou se vc realmente sabe que está sonhando e possui consciencia disso, até então eu sempre tive sonhos onde citava o fato de sonhar dentro do próprio sonho e isso é comum. A pessoa que aparece no seu sonho provavelmente é um personagem recorrente, é comum o material onirico repetir alguns lugares, ambientes ou pessoas assim como nosso amigo ART aqui do blog que sempre sonha a noite e geralmente com labirintos e eu costumo muito sonhar com algumas pessoas que conheçi a muito tempo e com minha primeira casa e talz.

  11. Paloma, como o Oliveira temas, persongens etc recorrentes são bem comuns. Eu ainda não parei para me analizar mas aos poucos eu noto algumas recorrências.
    Pouquíssimo ou quase nada se sabe como examente os sonhos são formados, não comprovadamente. Sendo assim não tem como afirmar com certeza se no seu caso influência. Entretanto, com uma pesquisa rápida, parece que a Disretimia Cerebral é capaz de alterar o estado da consciência. Uma vez que Sonhos Lúcidos são um estado alterado de consciência é possível que tenha influenciado.

    Essa parada de "hiperatividade na região rolândica do cérebro" complicou kkkkk nem achei sobre isso no Google. Me contate novamente daqui uns anos talvez, eu acho que vou especializar em neuro kkkk

  12. Eu fico na duvida. Tipo, quando eu fico lucido, sinto que eu e o mundo a minha volta se transformaram por assim dizer. E outra, ja repararam como o sonho lucido é dramaticamente mais dificil de manter sem acordar do que um sonho normal? Para mim isso sugere que os sonhos lucidos são um meio termo entre vigilia e rem. Como uma balança delicada, um meio termo. Se você erra no equilibro, dependendo para qual lado você pende você pode mergulhar fundo no rem (perder a lucidez) ou despertar de vez.

  13. É bem isso mesmo Eliezer. Durante um sonho lucido nosso cérebro sofre uma atividade maior de neurotransmissores permitindo assim que criemos o que chamamos de consciência mesmo em cenário onírico. Tal fato, criava duvidas aos cientistas da década de 70 que acreditavam ser impossível atingir certo grau de lucidez sem acordar exatamente por causa dos neurotransmissores, pois esse tipo de atividade liga sensibilidade dos sentidos comuns como audição e tato, podendo causar um despertar. Portanto sempre estamos em uma linha tênue em um sonho lucido, podendo cair em sono mais profundo, logo perdendo a consciência, ou acordando. Por isso é mais comum e até mais recomendável ter sonhos lúcidos durante as ultimas horas de sono REM onde seu corpo não está mais tão cansado para cair em sono profundo.

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